18 de março de 2013

Vigor aposta em produtos premium para brigar com tops

Há mais de um ano, empresa vem se esforçando para reduzir a participação de produtos com menor lucratividade

Uma pequena revolução está em curso na Vigor desde o ano passado. A empresa de laticínios dos Batista – controladores do JBS, o maior frigorífico do mundo – foi separada do negócio de carnes da família, lançou produtos com maior valor agregado e, há um mês, adquiriu metade da mineira Itambé, com receita líquida de R$ 1,8 bilhão. Por trás disso tudo está a intenção de transformar a companhia paulista em uma empresa nacional de alimentos com rentabilidade comparável à das gigantes europeias Danone e Nestlé, e vender essa história para os investidores em um IPO (oferta pública inicial de ações, em inglês). "Ainda há poucas empresas brasileiras de consumo com capital aberto", diz Gilberto Xandó, presidente da Vigor. "Queremos ser a maior empresa de lácteos do País e uma das maiores em alimentos."

Tecnicamente, a Vigor já está na bolsa. Em uma abertura de capital realizada no ano passado, acionistas da JBS puderam trocar seus papéis por ações da Vigor. Porém, apenas o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e a FB Participações (controladora da JBS, pertencente às famílias Batista e Bertin) aderiram com força à oferta, já que se tratava de deixar uma grande corporação e assumir uma empresa com liquidez modesta. Em 2013, o volume diário médio de negociações da Vigor é de apenas R$ 14 mil.

A ideia é que a JBS, que ainda detém uma participação de 21,32%, ofereça suas ações em uma oferta pública, assim que a Vigor atingir um porte considerado interessante pelos investidores. O primeiro passo para aumentar a atratividade da empresa já foi dado. Apesar de possuir apenas 50% da Itambé, a Vigor tem alguns privilégios na gestão da empresa mineira e, por isso, pretende consolidar o resultado total da companhia em seus balanços. Seguindo essa lógica, a Vigor já atingiu uma receita bruta de R$ 3,7 bilhões.

De dono em dono

Com uma trajetória de quase cem anos, a empresa já passou por uma série de donos, entre eles Ricardo Mansur, o controverso empresário do banco Crefisul e das varejistas Mappin e Mesbla. Em 2007, a empresa foi comprada pelo frigorífico Bertin, que, por sua vez, se fundiu com a JBS em 2009. Agora, a companhia não é apenas um projeto ambicioso dos Batista: é uma espécie de segunda chance do BNDES no setor. A primeira aposta, a Lácteos Brasil (LBR), foi criada há dois anos para consolidar e profissionalizar a cadeia do leite – mas falhou na tentativa de aumentar as margens de lucro. No mês passado, a LBR entrou com um pedido de recuperação judicial e o BNDESPar, braço de participações do banco estatal, registrou uma baixa contábil de R$ 657,5 milhões relativa ao laticínio.

Internamente, executivos do banco admitem que falharam ao investir na LBR. No caso da Vigor, o banco aderiu à oferta de ações que a separou do JBS e, desta forma, passou a deter 31% do capital da companhia. "Foi uma estratégia interessante do banco porque, em tese, a Vigor opera em um nível de margens superior ao consolidado da JBS e, sozinha, pode refletir melhor o valor ao acionista", diz Roberto Altenhofen, analista da Empiricus.

Há mais de um ano, a Vigor vem se esforçando para reduzir a participação de produtos com menor lucratividade e entrar em segmentos de margens mais altas. As vendas de leite UHT (em caixinha), por exemplo, caíram 23% em 2012 e representam hoje 7% do faturamento. Enquanto isso, os derivados lácteos (como queijos e iogurtes) cresceram 12%. O lançamento mais importante dentro da nova estratégia foi o iogurte grego, uma categoria que não existia no mercado brasileiro até meados do ano passado. A Vigor entrou com seu produto nos supermercados juntamente com a Nestlé, líder em lácteos no Brasil. Ainda não se sabe qual o impacto em termos de participação de mercado, mas o movimento marca uma nova postura da empresa.

Em 2012, a Vigor lançou 42 produtos – contra menos de 10 no ano anterior. Agora, o alvo é a líder Danone, que tem 37% do mercado de iogurtes. Em janeiro, a Vigor lançou, de uma só vez, os concorrentes diretos de três produtos funcionais da empresa francesa. Os iogurtes têm o mesmo apelo e a Vigor pretende oferecê-los a um preço de 15% a 20% mais baixo.

Alguns números dão uma dimensão da agressividade dessa estratégia. O Activia, produto da Danone para melhorar o funcionamento do intestino, é o iogurte mais vendido do Brasil. Sozinho, ele tem mais de 13% do mercado. Foi esse iogurte, aliás, que tirou a operação brasileira da Danone do prejuízo em 2004. Além do Activia, a Vigor também pretende abocanhar parte do mercado do Actimel, que ajuda na resistência do organismo, e do Densia, iogurte com cálcio.

A história recente mostra, porém, que essa não será uma tarefa simples. A Nestlé, segunda colocada na venda de iogurtes no País, lançou o funcional Nesvita em 2006, mas o produto acabou deixando o mercado três anos depois, diante de resultados insatisfatórios. Hoje, a BRF mantém itens funcionais em seu portfólio, mas com participação pouco expressiva. A Danone, por sua vez, contemporiza a entrada do novo concorrente. "Nosso principal objetivo não é fatiar o bolo, mas fazê-lo crescer", diz Mariano Lozano, presidente da Danone no Brasil, em uma referência ao fato de que o consumo per capita de iogurtes no Brasil ainda é pequeno se comparado a países como Argentina e França.

Na opinião de um alto executivo do setor, a estratégia da Vigor é acertada – mas será difícil atingir a mesma rentabilidade da concorrente. A margem operacional da Danone no Brasil está ao redor de 12%, enquanto a Vigor fechou o ano passado com 5%. Na opinião de Xandó, a empresa brasileira pode chegar ao patamar de 15%.

Desafio

Aumentar a rentabilidade é o grande desafio da Vigor – e a compra da Itambé não resolve o problema imediatamente. A empresa mineira fechou 2012 com uma margem operacional de 6% – maior, portanto, do que a da Vigor, mas longe do objetivo pretendido. Cerca de 40% da receita vêm de leite em pó, uma categoria com menor valor agregado. Por enquanto, um dos principais ganhos com o negócio é a presença intensiva da Itambé nos mercados de Minas Gerais, Rio de Janeiro e no Nordeste. A Vigor tem 70% de suas vendas concentradas em São Paulo.

As empresas continuarão operando separadamente, mas a Vigor já manifestou sua intenção de promover uma fusão nos próximos anos. "Esse seria o caminho natural para capturar todas as sinergias dessa operação, mas para isso a Vigor terá de voltar a negociar com o sócio", diz uma pessoa próxima às companhias. E as aquisições não devem parar por aqui. Segundo fontes do mercado, a Vigor já começou a mapear os concorrentes nas regiões Sul e Nordeste. A empresa nega que esteja estudando novas compras, mas a expansão é inevitável no audacioso projeto de criação de uma Vigor nacional.

Fonte: Estadão / 18/3/2013

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