08 de dezembro de 2011

Uma indústria que precisa se reciclar

Luciano Martins Costa - Jornalista e escritor, consultor em estratégia e sustentabilidade

O anúncio pela Ford Motors de investimentos de R$ 800 milhões na produção de um carro global, a ser feita no Brasil, marca a nova estratégia da empresa, de conceder mais autonomia a suas subsidiárias.

Trata-se do amadurecimento de um processo de descentralização de decisões quanto a design e tecnologia, que deverá proporcionar maior equilíbrio entre os modelos vendidos nos países desenvolvidos e nos demais mercados.

O setor tem sido acusado de continuar fornecendo aos países periféricos e aos emergentes modelos superados, inseguros e com defasagem tecnológica de duas décadas.

A liberdade para o desenvolvimento de novos modelos mais adequados a cada região, entre as quais o Brasil se destaca pelo crescimento das vendas nos últimos anos, é parte das novas estratégias da indústria global, que precisa transferir decisões para mercados mais aquecidos.

A competição obriga a um atendimento mais próximo e, mais do que nunca, o processo de fidelização se torna importante em uma circunstância como a da América Latina, onde uma nova classe social ascende ao mercado de veículos automotores.

Não há notícias seguras sobre as características do modelo global da Ford, mas pode-se supor que a empresa deverá investir em carros mais compatíveis com os novos tempos: com sistemas de propulsão limpos, construção segura, leve e compacta, materiais planejados para facilitar o processo de desfabricação após o tempo de vida útil do veículo.

Pressionada por questionamentos sobre o papel dos motores alimentados por combustíveis fósseis no dilema das mudanças climáticas, a indústria automotiva precisa sair da posição defensiva tradicional e se apresentar à sociedade como protagonista de soluções em vez de parte do problema.

O que a Ford anuncia não é um novo investimento, mas o redirecionamento de decisões já tomadas quanto ao montante a ser aplicado globalmente até 2015.

Apesar de não haver dinheiro novo envolvido, é relevante a mudança de estratégia, principalmente se for considerado que as novidades devem embarcar tecnologias limpas, como condição para melhor aceitação do mercado.

Já se foi o tempo em que os anúncios de novos modelos de automóveis destacavam apenas a beleza das linhas e a potência do motor. Agora, ao lado da segurança e da economia, é preciso deixar claro que o setor se preocupa com a sustentabilidade em todos os aspectos.

Enquanto a tecnologia não consegue produzir o carro absoluto, que não precisa carregar um tanque de explosivo, valem as alternativas de combustíveis de fonte renovável que não contribuem para o aquecimento global e os modelos que utilizam materiais reciclados.

Mas o impacto em termos de reputação será ainda maior quando o setor deixar de ser tangido pela legislação e assumir proativamente a missão de dar um salto de qualidade nos veículos que oferece fora dos mercados maduros, onde as normas há muito tempo exigem a oferta de sistemas de proteção eficientes para motoristas e passageiros, redução nas emissões de gases nocivos e baixo impacto ambiental.

Enquanto for apenas cumpridora de regras impostas de fora para dentro, a indústria será apenas considerada correta.

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Luciano Martins Costa é jornalista e escritor, consultor em estratégia e sustentabilidade

Fonte: Brasil Econômico - 8/12/2011

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