Ricardo Galuppo - Publisher do Brasil Econômico
O acordo celebrado ontem entre o Brasil e o governo dos Estados Unidos, pelo qual a cachaça passa a ser reconhecida como uma bebida genuinamente brasileira - que nada tem a ver com o rum -, é o tipo da notícia que pode acabar se revelando maior e mais positiva do que parece à primeira vista.
Em troca desse reconhecimento, o Brasil deixará de enquadrar o bourbon, o destilado de milho produzido no estado americano do Tennessee, na mesma categoria do uísque escocês.
Naquilo que diz respeito à nossa cachaça, a notícia é muito bem-vinda. Com mais de 30.000 produtores espalhados por quase todos os estados do país, a bebida é produzida de acordo com o mesmo processo do Chuí ao Oiapoque.
A cana-de-açúcar é moída e seu caldo, fermentado. Em seguida, ela é destilada e, em alguns casos, envelhecida em tonéis de madeira. O resultado disso é quase 1,5 bilhão de litros por ano, dos quais apenas 2% são exportados.
Se a decisão de ontem for acompanhada por um trabalho sério e profissional, ele pode significar uma oportunidade de outro para essa indústria florescer ainda mais no Brasil.
Com a decisão americana, cairá por terra uma barreira não tarifária a que a cachaça era submetida por culpa, principalmente, dos produtores, comerciantes e agentes públicos brasileiros.
Sim! Ninguém tem o direito de culpar os Estados Unidos pelo fato de, até ontem, não existir a menor distinção entre a nossa cachaça e o rum caribenho.
Para começo de conversa, pouquíssimas pessoas, no Brasil, dão à cachaça um reconhecimento semelhante ao que os escoceses dão a seu uísque, os mexicanos à sua tequila, os peruanos a seu pisco e daí por diante.
O brasileiro precisa aprender a respeitar um pouco mais a sua principal bebida. A cachaça desfruta entre nós de uma fama pouco edificante - que a associa a situações das quais é melhor manter distância.
Com a abertura do mercado americano à bebida brasileira (e, evidentemente, depois que o câmbio perder o efeito desestimulante que hoje tem sobre qualquer artigo de exportação produzido no Brasil), as vendas ao exterior podem aumentar de forma considerável.
Desde que, evidentemente, um número maior de produtores passe a se preocupar mais com a qualidade da bebida.
Sim. Uma das consequências positivas do acesso mais facilitado ao maior mercado consumidor do mundo deve ser a melhoria da qualidade de uma bebida que, uma vez produzida de acordo com os melhores padrões, é revestida de muita nobreza.
Nos últimos anos, alguns programas oficiais levados adiante pela Embrapa, pelo Sebrae-MG e pela Secretaria da Agricultura de Minas Gerais ajudaram os produtores a melhorar alguns aspectos críticos da fabricação e da comercialização da bebida (sobretudo no que diz respeito à higiene e ao marketing).
A evolução não pode parar por aqui. É lógico que, com todos os requisitos atendidos, a cachaça ganhará o mundo sem que para isso o governo tenha a necessidade de fechar o mercado à concorrência de outras bebidas.
Apenas com a vantagem competitiva de uma indústria que não precisa de proteção contra a bebida estrangeira (como reivindicam os produtores de vinho do Rio Grande do Sul). Beba com moderação.
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Ricardo Galuppo é Publisher do Brasil Econômico