27 de fevereiro de 2013

Quero conhecer a China, pois tudo é fabricado lá

Rogério Mori - Professor da Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (FGV/EESP)

Quando eu era criança, lá pelos idos dos anos 1970, um dos meus sonhos era visitar a maior fábrica de brinquedos brasileira. No meu imaginário infantil, essa fábrica, que produzia pura alegria para as crianças, deveria ser similar à fantástica e divertida fábrica de chocolates do sr. Wonka (filme marcante para a geração daquela época, refilmado recentemente).

Creio que motivado por sentimentos parecidos com os que eu tinha naqueles tempos, meu filho de nove anos proferiu há alguns dias as frases que dão título a este artigo.

De fato, ele tem constatado de forma recorrente que seus tênis, seus brinquedos, jogos e boa parte de suas roupas são originários da China.

Não explorei muito a fundo seus sentimentos, mas acredito que as crianças têm uma tendência a associar positivamente os produtos que elas gostam com os fabricantes que os produzem.

De qualquer forma, meu filho apenas constatou na sua percepção infantil algo que todos temos percebido na economia brasileira já há algum tempo: a oferta de produtos importados no mercado brasileiro tem crescido de forma sistemática, substituindo a produção doméstica.

Alguns economistas tendem a argumentar que as razões para isso residem na ineficiência da indústria brasileira, que não consegue competir com a produção de outros países.

Adicionalmente, argumentam que, mesmo que houvesse algum desalinhamento cambial no passado recente, a depreciação do real frente ao dólar ocorrida ao longo de 2012 corrigiu esse fenômeno e que o desaparecimento da indústria se deve a outros fatores que não decorrem do real forte.

Esses argumentos não se sustentam à realidade dos fatos. A taxa de câmbio real efetiva, que considera de forma ponderada pela pauta de exportações brasileira não apenas as oscilações das diferentes moedas, mas também a inflação relativa, é uma boa métrica da nossa competitividade.

De acordo com dados do próprio Banco Central, por essa medida, a moeda brasileira estava em dezembro do ano passado 11,3% mais apreciada atualmente que em junho de 1994, quando a cotação do dólar era de R$ 1.

É possível constatar em múltiplas dimensões o fenômeno do real forte: nunca o brasileiro viajou e gastou tanto no exterior quanto nos últimos tempos. Mesmo sendo um país de renda média, a percepção no exterior é de que o brasileiro ficou rico. Ao mesmo tempo, algumas de nossas cidades figuram entre aquelas que possuem os maiores custos de vida no planeta.

O reflexo disso sobre nossa produção é de um quadro de lenta e silenciosa desindustrialização: o produtor local, em face da incapacidade de concorrer com a produção externa, não cerra suas portas, mas transfere sua produção para outro país e se torna um distribuidor local, uma vez que já tem marca conhecida no mercado, canais de distribuição bem definidos, etc.

O grande perdedor com esse processo é o Brasil, que perde cada vez mais etapas de agregação de valor no processo produtivo. Em função disso, o quadro para a produção industrial brasileira não é dos mais promissores, ainda mais considerando-se que o governo, aparentemente, ainda quer evitar novas depreciações do real frente ao dólar para evitar pressões inflacionárias.

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Rogério Mori é professor da Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (FGV/EESP)

Fonte: Brasil Econômico - 27/2/2013

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