06 de dezembro de 2011

Gabrielli: “Está sobrando dinheiro no mundo”

Exclusivo

Ramiro Alves e Margarida Lopes (redacao@brasileconomico.com.br)

Gabrielli: “Não somos monopolistas. Somos grandes”

Presidente da Petrobras explica como empresa vai investir US$ 224 bilhões até 2015 e afirma que não teme os chineses.

De seu escritório no 23ª andar do imponente prédio na Avenida Chile, 65, no Centro do Rio de Janeiro, o economista José Sérgio Gabrielli, 62 anos, tem uma vista deslumbrante.

Sem esforço, vê o Cristo Redentor, o Pão de Açúcar e a Lapa, entre outros cartões postais que fizeram a fama da Cidade Maravilhosa. Mas no terraço, onde seus convidados sempre são levados, ele faz questão de apontar uma plataforma de petróleo no meio da Baia de Guanabara.

O homem é obcecado por combustível. Gabrielli é presidente da 8ª maior empresa global por valor de mercado e a maior do Brasil: US$ 164,8 bilhões, segundo dados da própria companhia.

O lucro líquido da Petrobras em 2010 foi de R$ 35 bilhões, o que deixou felizes seus mais de 570 mil acionistas, entre eles, governo federal, que detém o controle da multinacional.

Em entrevista ao Brasil Econômico, Gabrielli garantiu que está sobrando dinheiro no mundo. Ele não menospreza a crise, mas se justifica citando os bilionários números da indústria petrolífera: "Há hoje uma escolha seletiva de projetos onde o dinheiro vai ser aplicado."

Comandando a empresa há 6 anos e quatro meses, Gabrielli já é o presidente mais longevo da história de 57 anos da Petrobras.

Usa crachá e - mesmo acostumado a dar entrevistas - não gosta de fotos. Embora ainda não admita, pretende trocar o cargo por uma campanha política, provavelmente será candidato a governador da Bahia em 2014.

E, quem sabe, repetirá a sina do primeiro presidente da Petrobras, Juracy Magalhães, que governou a terra de Dorival Caymmi por 10 anos.

- O bilionário plano de investimentos da Petrobras corre algum risco?

Fizemos um aumento de capital de US$ 72 bilhões, o maior do mundo, em 2010. Assim reduzimos a nossa taxa de alavancagem, que estava em 35% para 17%, o que nos deu condições de voltar ao mercado de dívida. Nós temos uma projeção de investimentos de US$ 224,7 bilhões até 2015.

Temos em caixa hoje US$ 26 bilhões e vamos fazer um desinvestimento de US$ 13,6 bilhões. De atividade operacional, temos algo entre US$ 125 bilhões e US$ 149 bilhões, dependendo do preço do petróleo - US$ 125 bilhões se o preço do petróleo for US$ 80 o barril do brent e US$ 149 bilhões se o barril for a US$ 95.

E, portanto, vamos ter que levantar de dívida no mercado entre US$ 67 bilhões e US$ 91 bilhões. Sendo que nós temos que pagar de dívida velha entre US$ 30 bilhões e US$ 31 bilhões. Significa, portanto, que de dívida nova nós vamos precisar levantar entre US$ 37 bilhões e US$ 61 bilhões, o que dá entre US$ 7 bilhões e US$ 12 bilhões por ano.

Vamos chegar a uma alavancagem máxima de 29%, se fizermos esse programa. E a nossa razão dívida líquida sobre Ebitda será menor que 1,9 vezes. Portanto, do ponto de vista financeiro, não é um problema.

- Que tipos de ativos serão vendidos?

São três tipos: participações em blocos exploratórios, que temos em muitos países, ações de empresas e recebíveis que vamos vender para os bancos.

Se do ponto de vista financeiro não há problemas, a Petrobras pode enfrentar dificuldades com os fornecedores e com a formação de mão de obra. Como vocês estão se preparando?

Na preparação da mão de obra, estamos com um programa junto com o governo brasileiro chamado Prominp, que vai treinar 290 mil pessoas até 2015. São mais de 180 diferentes ocupações.

Esse treinamento é de pessoal para a cadeia de fornecedores. Também estamos viabilizando financiamento específico para fornecedores junto com os principais bancos brasileiros. Montamos um programa chamado Progredir, que está se aproximando de R$ 1 bilhão de operações já contratadas.

Que funciona assim: o fornecedor com um contrato com a Petrobras usa 50% do valor desse contrato como garantia ao banco e pega os 50% restantes e passa essa garantia para o seu fornecedor mesmo sem contrato com a Petrobras até o quarto nível da cadeia. Nos acreditamos que com isso será possível chegar a 255 mil empresas. Hoje já temos operações realizadas com um custo 40% menor do que o preço de mercado.

- As metas de produção mudaram?

Não. As metas não são feitas com base nas explorações novas. Em termos de produção de petróleo no Brasil, vamos sair dos 2,1 milhões de barris diários, que produziremos no final de 2011, e vamos chegar a 3 milhões de barris no final de 2015, alcançando 4,9 milhões de barris em 2020. Isso de petróleo.

Se somarmos petróleo e gás, no Brasil e no exterior, nos vamos atingir em 2020, 6,4 milhões de barris por dia.

- E a questão do vazamento na Bacia de Campos? Como a Petrobras, que é sócia da Chevron na operação do Campo de Frade, está acompanhando o caso?

Não faço comentários. Quem fala sobre o tema é o operador, que se chama Chevron.

- Como o senhor vê o aumento da presença da chinesa Sinopec na Bacia de Santos?

Isso demonstra que a Sinopec, que é nossa parceira em vários segmentos, está muito interessada no Brasil. Temos um longo contrato de fornecimento de petróleo para a Sinopec na China.

Ela não adquiriu diretamente participação nos blocos e nem entra na gestão dos campos, mas adquiriu participação tanto na Repsol como na Galp. E não são só eles. A Shell, a Chevron já anunciaram que vão aumentar investimentos no Brasil, a Total quer investir. As empresas de petróleo do mundo estão muito interessadas em vir para o Brasil.

- Esse movimento ameaça a Petrobras?

Não. A Petrobras trabalha com todas essas empresas. Nos não somos monopolistas. Somos grandes (risos).

- O governo sempre faz pressão por uma maior nacionalização. Como anda o embate?

O problema nosso de fornecimento, o atraso das sondas, não tem nada a ver com conteúdo nacional. Tem relação com a crise internacional. Tem a ver, exclusivamente, com dificuldades dos fornecedores internacionais de entregarem no prazo adequado que foi contratado. O conteúdo nacional está sendo construído.

É um efeito que pode vir a acontecer, se acontecer, no futuro. O problema é o fornecimento que é muito grande para uma empresa que está com o maior o maior programa de compras do mundo na área de offshore. Então, não é à toa que a Rolls-Royce está vindo para o Brasil, a GE está vindo. O volume de empresas que estão vindo para o Brasil para fazer os produtos é muito grande.

Objetivamente, as sondas que estão em processo de contratação hoje chegarão para a Petrobras em 2016. Portanto, nos temos até lá para acompanhar a construção e a viabilidade da expansão dos estaleiros.

- Qual a sua preocupação com a volatilidade do mercado de petróleo?

Olhando a tendência de longo prazo, eu diria que não há motivo para esperar uma queda de preço do petróleo. Primeiro: o petróleo novo será mais difícil e os custos de produção mais altos.

Do ponto de vista da oferta, só para compensar o declínio da produção atual, que está em torno de 86 milhões de barris por dia, o mundo precisará produzir entre 45 milhões e 65 milhões de barris novos. Se olharmos a demanda per capita de petróleo na Europa, nos Estados Unidos, no Japão, a perspectiva de médio e longo prazos é de declínio, vai haver uma redução, como ocorreu nos últimos cinco anos.

Porém, se você olhar o que aconteceu de 2000 a 2010, o consumo de petróleo nessas regiões caiu, mas se você olhar o consumo mundial de petróleo, aumentou. Por quê? Porque o consumo na China, na Índia, na África, na América Latina, está crescendo.

- Mas dá para garantir que o consumo continuará crescendo?

Acredito que sim e por duas razões: primeira, o crescimento do PIB dos emergentes vai continuar mais alto do que o da Europa, dos EUA ou do Japão.

Segundo, e mais importante, é que o crescimento nos emergentes envolve a inclusão de segmentos, que saem da pobreza e entram numa faixa de renda mais alta. A saída da pobreza é intensiva em energia, intensiva no consumo de derivados de petróleo. Portanto, do ponto de vista dos fundamentos da economia, do mercado de petróleo, não há porque o preço cair.

Segundo: estamos vivendo esse processo de aumento de preços numa conjuntura mundial em que a taxa de juros é baixa, com a exceção do Brasil. E essa taxa de juros acontece num momento em que a economia mundial não sofre problema de liquidez. Não há falta de dinheiro no mundo.

Há uma escolha seletiva de projetos onde o dinheiro vai ser aplicado. Enquanto a semana passada a Alemanha teve problemas para fazer a rolagem de sua dívida, o Catar teve seis vezes mais demanda do que precisava e captou US$ 5 bilhões.

Hoje você tem US$ 1,6 trilhão além do que seria a reserva técnica dos bancos americanos no Fed. É uma questão de opção, pois há sempre uma busca por retorno e segurança. Consequentemente, o mercado de commodities, principalmente o de petróleo, passa a ser uma aplicação financeira.

Por isso que o volume de contratos transacionados, num mercado que tem uma demanda física de 86 milhões a 87 milhões de barris e nove vezes maior, dez vezes maior. São negociados de 560 milhões a 600 milhões de barris por dia.

Claro que com prazos diferentes, não é tudo curto prazo. Enquanto tivermos essa conjuntura de taxa de juro baixa, a volatilidade do mercado de petróleo será muito alta. A indústria do petróleo é de longo prazo. Você não pode se mover pelo curto prazo.

Fonte: Brasil Econômico - 6/12/2011

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