Fonte: A Tribuna - 6/4/2014, página A-4, Cidades
DA REDAÇÃO
Os investimentos no Porto de Santos projetam a expansão da movimentação de cargas para os próximos anos. No entanto, a Via Anchieta, construída na década de 1940, continua sendo a principal ligação para caminhões entre o Planalto e a Baixada Santista.
A falta de opções de acesso ao cais santista é um limitador para o crescimento do maior complexo portuário da América do Sul, conforme apontou o presidente da Codesp, Renato Barco, na última terça-feira, durante a 20.ª edição da Intermodal South America, na Capital.
Enquanto uma solução para o problema não é encontrada, os constantes congestionamentos seguem interferindo na vida dos moradores da região. A ausência de alternativas prejudica, inclusive, o fluxo de turistas em feriados prolongados e período de férias.
Com o objetivo de superar esse entrave logístico e estimular uma nova via de desenvolvimento econômico, a empresa Contern elaborou uma proposta de ligação de 36 quilômetros (sendo 21 quilômetros de túneis) entre o Trecho Leste do Rodoanel, em Suzano, até a Rodovia Cônego Domênico Rangoni, na Área Continental de Santos.
A iniciativa faz parte de um projeto arrojado chamado Via Mar – Complexo Multimodal, que engloba ligações férrea e de dutos para o transporte de granéis e prevê a ocupação da parte continental santista e a construção de plataformas logísticas para o transbordo ágil e organizado de cargas.
O empreendimento está orçado em R$ 15 bilhões. Entretanto, a ideia primordial é tirar do papel a ligação para desafogar o trânsito de caminhões e veículos de passeio do Sistema Anchieta-Imigrantes (SAI). A rodovia deverá custar R$ 6,6 bilhões.
Algumas empresas já demonstram interesse em injetar recursos na proposta, já sob análise da Secretaria de Estado de Logística e Transportes desde meados do ano passado.
Conforme apurado por A Tribuna, a pasta deu parecer favorável à iniciativa e a encaminharia ao Conselho Gestor das Parcerias Público-Privadas (PPPs) na sexta-feira. A expectativa é que o órgão se pronuncie a respeito do estudo neste mês. Caso a resposta seja positiva, o Estado concederá a Manifestação de Interesse da Iniciativa Privada (MIP) àqueles que quiserem desenvolver um projeto básico da nova ligação. Obrigatoriamente, o estudo precisa ser entregue ao Estado em seis meses, ou seja, até outubro – se o prazo anterior for cumprido.
Depois, o Estado terá condições de abrir concorrência pública para a concretização da obra.
A Tribuna entrou em contato com a assessoria da Secretaria de Logística e Transportes na sexta-feira para saber como está a análise da medida, mas não obteve retorno até o fechamento desta edição.
OBSTÁCULOS
O consultor especial da Contern para a área de Logística e Transporte, Wagner Ferreira, aponta que a obra é necessária em razão de dois grandes obstáculos: cruzar a Capital e o intenso tráfego de veículos rumo à Baixada Santista. “A importância do Porto de Santos é indiscutível para a economia brasileira, mas temos que trabalhar com um novo conceito. Fisicamente, o Porto continuará aqui embaixo, mas operacionalmente pode ocupar o Planalto, que possui grandes áreas disponíveis”, explica.
Por esse motivo, algumas prefeituras, como Itaquaquecetuba, Suzano, Poá, Mogi das Cruzes, Ferraz de Vasconcelos e Rio Grande da Serra estão alterando seus planos diretores tendo em vista essa oportunidade de negócios e geração de trabalho e renda localmente. “Essa obra de integração regional vai beneficiar todo o Estado, a partir da região de São José do Rio Preto, do Triângulo Mineiro e do sul de Goiás. Isso sem contar o Vale do Paraíba. Quem sair de lá não precisará cruzar São Paulo e conseguirá fazer o trajeto para a Baixada Santista na metade do tempo atual”, destaca.
INVESTIMENTOS
A Contern já investiu cerca de R$ 6,5 milhões em estudos, que foram iniciados há pouco mais de um ano e meio. O trabalho foi financiado por uma empresa nacional, cujo nome não foi revelado. “Foram feitas várias viagens pelo mundo para conversar com as melhores empresas e grandes empreendedores nacionais para desenvolver os projetos da linha férrea, túnel e estruturas. Recentemente, fizemos um acordo de cooperação tecnológica com o Port of Antwerp International (PAI, a consultoria belga de área portuária é uma das maiores do mundo)”, afirma Ferreira.
Caso tenha o sinal verde do Estado, o consultor explica que o grupo já possui em torno de R$ 29 milhões para a elaboração de estudos mais aprofundados para tirar a obra do papel.
UMA 'NOVA BRASÍLIA', COM 500 MIL HABITANTES, NA ÁREA CONTINENTAL
A Área Continental de Santos, formada por 231,6 quilômetros quadrados, poderá deixar de ser um sinônimo de tranquilidade e de pequenas comunidades para se tornar um grande centro de negócios, condominial e de instituições de ensino nos próximos anos.
Pelo menos essa é uma das propostas do estudo da Contern, no qual se cogita a ocupação ordenada desse espaço pouco explorado, do qual 89% são considerados área de proteção ambiental.
Chamado de Ilha Portal, o empreendimento prevê que esse novo espaço abrigue cerca de 500 mil habitantes. Para comparação, a população de Santos inteira no ano passado era estimada em 433.153, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
“A proposta é semelhante à criação de uma outra cidade na Área Continental. Queremos criar uma espécie de nova Brasília em Santos, mas em uma escala menor. Temos condições viáveis de tornar isso uma realidade”.
E completa: “A maior parte dos escritórios das empresas que operam o Porto de Santos está na (Avenida Engenheiro Luís Carlos) Berrini – importante polo comercial da Capital – e poderia ser instalada nesse local”.
Além disso, está projetada a construção de duas plataformas na Área Continental que visam à redução do tempo de embarque e desembarque de contêineres.
INTEGRAÇÃO
O consultor Wagner Ferreira destaca, ainda, que é possível integrar essa região com outras cidades e com a área insular de Santos por meio de um sistema de hidrovias para passageiros. “Esse grande potencial foi identificado durante o estudo que desenvolvi para a Secretaria Especial de Portos, sobre a possibilidade de usar os rios como apoio para o carregamento e descarregamento de cargas do Porto”, comenta.
POTENCIAL
Dutos
Uma das propostas do projeto é que os dutos possam fazer o transporte de cereais, o que diminuiria bastante o tráfego de caminhões e de trens do Centro-Oeste rumo ao Porto de Santos para o descarregamento de grãos. Os terminais previstos para serem construídos na Área Continental de Santos teriam uma capacidade de armazenamento de 1,8 vez maior que a das empresas do Corredor de Exportação, na Ponta da Praia.
Proposta positiva
O consultor Wagner Ferreira julga acertada a proposta da Prefeitura de Santos de transferir os terminais de grãos para a Área Continental de Santos. “Essa medida é necessária por uma questão logística. Há alguns meses, vim ao Terminal 37, mas errei o portão de entrada. Tive de levar meia hora esperando para cruzá-lo, enquanto demorei 42 minutos de viagem de São Paulo a Santos”, justifica.
UMA VIA FÉRREA SOB A ESTRADA
Uma das principais reivindicações dos moradores da Grande São Paulo e da Baixada Santista é que o Estado reative a linha férrea para passageiros entre a Capital e Santos.
O estudo da Contern aponta que essa possibilidade poderá sair do papel porque haverá uma ligação férrea sob a rodovia para o transporte de cargas e de passageiros.
O consultor Wagner Ferreira aponta que a Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) está construindo o Monotrilho da Zona Leste. Uma das estações ficaria no Bairro Sapopemba, a 3,5 quilômetros do local onde seria iniciada a nova ligação rumo à Baixada Santista. Portanto, bastaria a aprovação de uma extensão até Suzano para viabilizar uma nova forma de deslocamento entre as regiões.
“Embora a ferrovia esteja projetada para ter uma grande demanda para o transporte de cargas, nossos estudos apontam que há conforto para também atender ao sistema de passageiros. O número previsto de viagens diariamente ainda está sendo analisado”, explica.
Ferreira acredita que o potencial dessa nova forma de deslocamento entre as regiões será muito grande em decorrência da criação de linhas para unir São Paulo e São José dos Campos, no Vale do Paraíba.