Murillo de Aragão - Cientista político e presidente da Arko Advice Pesquisas
Nos últimos 30 anos, a agenda econômica do Brasil foi ocupada sucessivamente pelos seguintes temas: combate à inflação; estabilização da moeda; distribuição de renda; crescimento econômico. Não é uma agenda de gestão. Tampouco de conciliação ou de continuísmo, e sim de enfrentamento de problemas graves de estrutura.
À sua maneira, o Brasil conseguiu lidar com as agendas postas e se saiu bem na maioria delas. Logramos obter um bom resultado no combate à inflação. Conseguimos criar uma moeda estável. Iniciamos um processo significativo de distribuição de renda. E, mais recentemente, atacamos uma agenda de crescimento. Com as virtudes e os defeitos típicos de nosso modelo, vamos indo, entre erros e acertos.
Uma das questões debatidas no Aspen Fórum, em Roma, foi a existência ou não de um modelo brasileiro. O tema veio à tona porque o pensamento econômico anglo-saxão considera que o Brasil, como sucesso econômico, é um embuste, pelo simples fato de não terem sido implementadas as reformas necessárias para tornar o país competitivo.
A despeito de não haver um rótulo para o modelo brasileiro - assim como o chinês, que é chamado de capitalismo de Estado -, o Brasil segue um conjunto de princípios ideológicos e econômicos que podem ser configurados como sendo um modelo tupiniquim que, tal qual a jabuticaba, só existe por aqui.
O modelo brasileiro guarda muitas identidades com outras fórmulas que têm no Estado o ator central da economia. No entanto, isso não é suficiente para evitar o caráter específico do modelo brasileiro. E o caráter específico da solução brasileira está no fato de conciliar um modelo quadripartite que admite a presença do Estado, do capital nacional, do capital estrangeiro e dos fundos de pensão, tendo, ainda, o BNDES como financiador e coordenador.
O modelo brasileiro permite participações majoritárias estrangeiras em muitos ramos da economia. As exceções são mínimas. Não ocorre, por exemplo, tal fenômeno na China, onde o Estado decide quem pode fazer o quê e com quem. O modelo brasileiro tem no fluxo de informação uma vantagem respeitável frente aos demais modelos baseados na predominância do Estado. E, finalmente, o modelo brasileiro - ao contrário dos demais países do Brics - permite uma significativa participação da sociedade civil no debate sobre prioridades.
O modelo tupiniquim está sendo questionado. Muitos acreditam que o desenvolvimento com base no consumo já se esgotou e que o governo faz muito bem em liberar as forças do mercado para atuar mais efetivamente na infraestrutura ou nos meios de concessões e Parcerias Público-Privada. É um caminho natural para um país que conseguiu obter estabilidade fiscal e controlar sua dívida pública.
No entanto, não devemos considerar que o modelo de estímulo ao consumo está esgotado. Não está. Temos ainda mais de 13 milhões de brasileiros abaixo do nível da pobreza. A população com renda domiciliar per capita abaixo dessa linha ainda corresponde a 10,2% do total. Incorporar tal segmento ao processo econômico de forma digna é um desafio a ser enfrentado.
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Murillo de Aragão é cientista político e presidente da Arko Advice Pesquisas
Fonte: Brasil Econômico - 23/10/2012