Miguel Setas - Vice-presidente de distribuição e inovação da EDP no Brasil
Na semana passada, a empresa de inteligência de mercado Pike Research revelou que o nível de apoio da opinião pública americana às energias limpas vem caindo desde 2009, quando 50% da população se dizia "extremamente favorável" ou "muito favorável" às novas tecnologias como carro elétrico e redes inteligentes.
Em 2010, esse índice caiu para 45% e, em 2011, para 43%.
Os resultados deste estudo surgem em um momento desfavorável para o setor clean-tech dos Estados Unidos que começou em 2008, com a crise financeira, e se agravou nos últimos anos, com a forte redução dos preços de gás natural (o custo de produção de energia elétrica com gás natural caiu 40% desde 2008) e a invasão dos painéis solares chineses, que já detêm mais de 54% de participação do mercado global de painéis (era 6%, em 2005).
A recente falência da empresa Solyndra, um dos principais produtores americanos de painéis solares, é um sintoma dessas dificuldades.
Este aparente arrefecimento da energia limpa americana está na contramão da anunciada Terceira Revolução Industrial (TRI), como a designou o economista Jeremy Rifkin no seu novo livro.
Para o professor Rifkin, esta TRI resultará da fusão do "conceito da internet" com as energias renováveis, conduzindo ao advento de uma verdadeira "internet da energia", que vai revolucionar a forma como a sociedade, as empresas e as pessoas se relacionam e se organizam.
A nova "internet da energia" será sustentada por mudanças de comportamento do mercado.
A primeira delas será o crescimento da geração de energia a partir de fontes renováveis. Cada edifício será capaz de produzir a sua própria energia, a partir de fontes renováveis, tornando-se uma pequena usina elétrica.
Essa energia poderá ser armazenada, possivelmente em células de combustível, e todos os consumidores poderão "trocar" energia entre eles, como hoje se trocam dados pela internet.
Os veículos serão elétricos e poderão carregar ou descarregar energia para a rede. Este será o conceito de uma "democracia de energia".
Um elemento crítico desta futura "enernet" (energy+internet) será o armazenamento local de energia, que ainda não assumiu formatos comercialmente viáveis.
Uma das possíveis soluções será o armazenamento sob a forma de energia química do hidrogênio.
A conversão se dá pelo processo de eletrólise da água, na qual a passagem de energia elétrica (gerada por fontes renováveis) separa as moléculas de água em átomos de hidrogênio e oxigênio.
O hidrogênio, então, poderá ser armazenado para posterior utilização em células de combustível, que recombinam o oxigênio do ar com o hidrogênio para gerar novamente eletricidade, quando esta é necessária.
Esta "internet da energia" já está sendo testada em seis regiões da Alemanha, em um projeto (E-Energy) que mereceu forte apoio da chanceler Angela Merkel.
O anunciado encontro desta semana entre a presidente Dilma Rousseff e a líder alemã, em Hannover, seria uma boa oportunidade para criar um intercâmbio entre o Brasil e as experiências europeias de redes de energia inteligentes.
Esperemos que o "tsunami monetário" não monopolize o encontro.
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Miguel Setas é vice-presidente de distribuição e inovação da EDP no Brasil
Fonte: Brasil Econômico - 7/3/2012