May 08, 2012

O suco de uva e a limonada

Mara Sampaio - Psicóloga e especialista em cultura empreendedora

Assisti recentemente a uma palestra de Marcelo Sales sobre sua trajetória empreendedora. Ele é dono da Movile, empresa que desenvolve serviços de interatividade baseados em mensagens de texto, aplicativos (músicas, jogos, vídeos e imagens) e plataformas para telefones celulares.

É, também, sócio da aceleradora de empresas 21121. Na sua apresentação, relembra que em sua infância na cidade de Petrópolis, junto com seus irmãos, vendia suco de uva. Na casa de sua família existia uma parreira grande da fruta e na época da colheita eles produziam mais suco do que a família conseguia consumir.

Foi, então, que ele teve a ideia de oferecer gelado para operários de uma construção perto da sua casa. Cada copo era vendido por R$ 0,50 e o negócio foi um sucesso. Para Marcelo, o suco de uva foi a base de sua trajetória empreendedora.

Eu mesma tenho um caso parecido na infância. Quando vinha nos visitar, na cidade em que morávamos, meu avô trazia dúzias de ovos da fazenda em que morava. Eu e meu irmão colocávamos os ovos em uma cesta e os vendíamos na vizinhança.

Cada um que fizer uma retrospectiva na vida encontrará um momento na infância ou adolescência onde descobriram algo diferente para fazer e ganhar um dinheiro extra. Ou para juntar o suficiente para comprar um objeto que desejava. É clássica a história da limonada na vida das crianças americanas.

No verão, elas vendem o copo do suco na porta de suas casas e, com a experiência, aprendem a lidar com dinheiro, com pessoas e, principalmente, a valorizar a atitude empreendedora.

Experiências como essas são essenciais para a formação das crianças nos Estados Unidos. São a semente da ação criativa e da geração de valor a partir do próprio trabalho.

A diferença entre a sociedade americana e a brasileira é que aqui estas experiências são iniciativas isoladas e não uma característica cultural. A família tem um papel fundamental no desenvolvimento de atitudes empreendedoras. Na infância podem ser despertadas características de comportamento que no futuro serão importantes para conectar trabalho, prazer e sucesso.

Esta é a conexão que Marcelo faz entre o suco de uva da infância e os aplicativos para celulares de hoje em dia. As situações de vida proporcionadas pela sua família e, principalmente, o apoio que teve de seus pais nas suas decisões no início de sua formação acadêmica ajudou na sua escolha por empreender.

Os pais têm um papel importante na trajetória profissional dos filhos. Mais do que a escolha de uma boa escola para prepará-los para uma universidade bem conceituada, é a influência de seu modo de vida e a forma de relacionar-se com o trabalho que será preponderante na escolha de ser ou não ser empreendedor.

As atuais gerações moram mais tempo com os pais. A adolescência se prolonga e o amadurecimento dos filhos depende bastante desta convivência. O lado positivo deste fenômeno é que se pode por mais tempo proporcionar experiências familiares ricas em exemplos de atitudes empreendedoras.

Despertar nos filhos o prazer pelas conquistas pessoais e estimular a autonomia nas crianças pode estar em situações simples como vender suco de uva. Quem sabe isso não pode se tornar um traço cultural brasileiro?

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Mara Sampaio é psicóloga e especialista em cultura empreendedora

Fonte: Brasil Econômico - 8/5/2012

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