Guilherme Balza
Do UOL Notícias*
Em São Paulo
O Sindicato Nacional dos Aeroportuários (Sina), que representa os servidores públicos da Infraero (estatal federal que administra os aeroportos), anunciou que os trabalhadores dos aeroportos de Guarulhos, Viracopos (ambos em São Paulo) e Brasília decidiram cruzar os braços a partir da meia-noite desta quinta (20) e ficar parados até sexta-feira (21). A categoria é contra a privatização dos três terminais, que começarão a ser entregues à iniciativa privada até o início de 2012.
Diante da decisão dos aeroportuários de manter a paralisação, o governo divulgou na quarta-feira (19) nota na qual mantém a Mesa de Diálogo com a categoria. Os representantes dos aeroportuários se reuniram com o governo durante todo o dia, mas não houve acordo.
O governo não abre mão de manter o modelo de concessão para os aeroportos de Guarulhos (São Paulo), Viracopos (Campinas) e Brasília, que garante à Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero) até 49% do controle dos três terminais. Os trabalhadores não aceitam esse ponto. "No decorrer dos trabalhos da Mesa de Diálogo aprimoramentos importantes foram realizadas no modelo de concessão, atendendo demandas dos trabalhadores. Entre elas, se decidiu pela manutenção da gestão estatal da navegação aérea nos três aeroportos", destaca a nota.
Participaram das reuniões hoje o secretário de Aviação Civil, Cleverson Aroeira da Silva, o presidente da Infraero, Gustavo Vale, o assessor especial da Secretaria-Geral da Presidência da República, José Lopez Feijóo.
Representando os aeroportuários participaram o presidente do Sindicato Nacional dos Aeroportuários, Francisco Lemos, o secretário-geral da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Quintino Severo, e o presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transportes Paulo Estausia.
Segundo Marcelo Tavares, diretor do sindicato, a expectativa é de que cerca de 3.000 trabalhadores participem da paralisação. “Infelizmente, os usuários dos aeroportos vão sofrer com atrasos. Apenas os trabalhadores em cargo de confiança não deverão participar da greve”, afirmou.
A concessão dos terminais à iniciativa privada, que já vinha sendo estudada no governo Lula, foi decisão da presidente Dilma Rousseff. De olho na Copa de 2014 e nas Olimpíadas de 2016, o governo alega que as concessionárias têm mais capacidade de realizar investimentos para ampliar a capacidade dos aeroportos e evitar um novo caos aéreo.
O Sina é filiado à CUT (Central Única dos Trabalhadores), que está dando apoio integral na mobilização da categoria contra a privatização dos aeroportos. Os principais dirigentes da central, inclusive, participaram de protestos recentes nos aeroportos.
Em um deles, no último dia 7, em Guarulhos, os manifestantes entoaram palavras de ordem contra a presidente. “Dilma, eu não me engano, privatização é coisa de tucano” ou “Dilma, eu não entendo, o nosso patrimônio, você está vendendo”, foram alguns dos slogans cantados.
Além de Dilma, o ministro da Defesa, Celso Amorim, é do PT, aliado histórico da CUT e sigla a qual os principais dirigentes cutistas estão filiados. Nas últimas eleições presidenciais, a CUT declarou apoio à Dilma e puxou outras quatro centrais para a campanha (Força Sindical, CTB, Nova Central e CGTB).
Nos documentos e manifestos contra a privatização, tanto o Sina, quanto a CUT poupam Dilma e o novo ministro da Defesa, Celso Amorim, que não costumam ser citados. As críticas das entidades recaem principalmente sobre o ex-ministro Nelson Jobim e a presidente da Anac (Agência Nacional de Aviação Civil), Solange Vieira, apontados como os responsáveis pela privatização.
Para o ministro da Secretaria de Aviação Civil, Wagner Bittencourt, a paralisação não se justifica, já que, segundo ele, o processo de privatização está sendo transparente.
“É uma questão sensível, mas acreditamos na responsabilidade dos funcionários. Temos participado de reuniões desde o início, formando mesas de diálogo com eles e mostrado que ninguém será prejudicado. Por isso, na avaliação do governo, e tendo por base a transparência e a mesa [de diálogo] criada, não se justifica uma greve", afirmou.
Transtornos
A Secretaria de Aviação Civil e a Anac solicitaram às empresas aéreas e à Infraero planos de contingência para que sejam evitados transtornos aos passageiros durante a greve. Foram solicitadas às empresas aéreas que divulguem eventuais repercussões em suas atividades operacionais, pelos meios disponíveis, canais institucionais e informação direta aos passageiros nos aeroportos.
Os órgãos também orientam os passageiros que entrem em contato com sua empresa aérea para confirmar os horários de seus voos.
Para registrar reclamações na Anac, os passageiros contam com atendimento 24 horas, em qualquer localidade, por meio do telefone gratuito 0800 725 4445 –com atendimento inclusive em inglês e espanhol– ou pela internet, no endereço: www.anac.gov.br/faleanac.
Modelo de concessão
A privatização dos aeroportos será feita no modelo de concessão, no qual todas as funções hoje sob responsabilidade da Infraero passarão para o comando de uma Sociedade de Propósito Específico (SPE), formada por investidores privados e pela própria estatal. Enquanto as empresas privadas terão no mínimo 51% das ações da sociedade, a Infraero terá no máximo 49%.
Os editais de licitação já foram publicados e ficarão sob consulta pública até o final do mês. O leilão deve ocorrer entre dezembro e janeiro. O valor mais alto de concessão será o do aeroporto de Guarulhos --R$ 2,9 bilhões, por 20 anos. Viracopos será concedido por, no mínimo, R$ 521 milhões, com prazo de 30 anos de concessão. Brasília terá o menor valor, de R$ 75 milhões, por 25 anos de contrato.
O concessionário de Guarulhos deverá pagar ao governo 10% de sua receita bruta todos os anos. Quem vencer o leilão de Viracopos precisará entregar 5%. Em Brasília, o valor de contribuição foi definido em 2%.
Além dos três terminais, o Aeroporto de São Gonçalo do Amarante, que está sendo construído na região metropolitana de Natal, foi privatizado em agosto. O governo também estuda transferir para o setor privado a exploração de outros aeroportos internacionais, como Galeão-Tom Jobim, no Rio de Janeiro, e Confins, em Minas Gerais.
Críticas à privatização
O Sina afirma que a privatização dos aeroportos é um erro comparável ao abandono do sistema ferroviário a partir da década de 50 e foi decidido com base em estudos acadêmicos sem aplicação prática. O sindicato acredita que as tarifas de embarque irão subir, o que provocará o aumento das passagens e a elitização dos aeroportos.
A privatização, na avaliação do Sina, irá ainda piorar os serviços aeroportuários, o que aumentará a vulnerabilidade da segurança operacional e de voo, na medida em que os novos profissionais não tem a qualificação dos servidores da Infraero.
A proposta dos sindicalistas ante a privatização é explorar comercialmente os espaços dos aeroportos, transformando-os em algo semelhante a shoppings centers. O argumento é que, nos últimos oito anos, o número de passageiros aumentou em mais de 110%, mas não houve aproveitamento das possibilidades comerciais, que poderiam gerar lucros à Infraero superiores ao que será pago pela iniciativa privada.
A reportagem procurou a secretaria de Aviação Civil para comentar as críticas, mas o órgão disse que não irá se manifestar por enquanto.
Telefone para registrar reclamações na Anac: 0800 725 4445 (24h) ou pela internet: www.anac.gov.br/faleanac
A privatização na avaliação dos grevistas
- É comparável ao abandono do sistema ferroviário na década de 50
- As tarifas de embarque irão subir, o que provocará o aumento das passagens e a elitização dos aeroportos
- Irá piorar os serviços aeroportuários, o que aumentará a vulnerabilidade da segurança operacional e de voo
- Foi decidida com base em estudos acadêmicos sem aplicação prática
*Com informações da Agência Brasil e do Valor Online
Fonte: Uol - 20/10/2011