February 06, 2014

Armadores podem mesmo operar sem registro, ANTAQ cita LEI 9432/97, mas advogado contesta

Fonte: NetMarinha / 6/2/2014


Como o Brasil não dispõe sequer de um navio próprio no comércio internacional – os remanescentes estão na cabotagem – todo o comércio exterior é servido por navios estrangeiros. No ano passado, o comércio foi de quase meio trilhão de dólares: US$ 242 bilhões na exportação e US$ 239 bilhões na importação. De um lado, pode-se dizer que essa frota presta serviço inestimável ao Brasil, pois, bem ou mal, as mercadorias entram e saem do país. Porém, há que se ir um pouco mais longe.

Começou um movimento no sentido de se exigir que os armadores estrangeiros sejam registrados e fiscalizados. Também se deseja saber o que é feito com a taxa de capatazia (THC-Terminal Handling Charges) e se ela é usada, indevidamente, para pagar a praticagem dos navios. Igualmente, nos custos portuários extras, a demourrage, não há transparência.

Não se trata de movimento jacobinista, de nacionalismo ferrenho e retógrado – no estilo de Cristina Kirchner, Nicolás Maduro ou Evo Morales – mas de seguir o que fazem União Européia e Estados Unidos. A UE abriu processos formais para apurar se há um cartel no transporte marítimo internacional. Nos Estados Unidos – que jamais abrem mão de seu pragmatismo, seja ou não politicamente correto – a Federal Maritime Commission está ampliando o controle sobre a operação dos estrangeiros, tanto em carga como em relação aos navios de passageiros.

Sobre o tema, escreveu um dos maiores especialistas do país, o advogado e ex-marítimo Osvaldo Agripino, pós-doutor em regulação de transportes e portos pela Universidade de Harvard: “ Nesse cenário, cabe uma pergunta: qual a relação desse fato com a responsabilidade civil da União, vez que a Antaq é uma autarquia federal vinculada à Secretaria Especial de Portos e não tem cumprido o marco regulatório, com a outorga de autorização, nem exigido garantias, como apólice de seguros para os passageiros, dentre outras, para armadores estrangeiros operarem no Brasil?”.

Segundo ele, não é incomum nos depararmos com problemas de citação de armadores na pessoa do seu agente marítimo e, depois de vários anos, com a execução da sentença, a mesma não tem liquidez. “Em recente ação de indenização por danos materiais e morais de trabalhadora brasileira (camareira), que embarcou no Brasil em navio de passageiros e se acidentou no mesmo, ajuizada contra a agência marítima (com o mesmo nome do armador) que a contratou, o Juiz do Trabalho determinou que “trouxesse” um documento oficial (certidão) comprovando que a agência é representante legal do armador do navio onde se deu o acidente, embora saibamos que inexiste tal certidão”, aponta Agripino.

Isso se dá, porque  os armadores estrangeiros que transportam mercadorias e e passageiros, ironicamente, atuam no Brasil sem qualquer autorização da Antaq, em total afronta ao dever de autorizar (ou não, caso não preencha os requisitos da Antaq) e insculpido no marcos constitucional e civil (Código Civil) e regulatório setorial (Lei n. 10.233/2001).

“Se em acidentes da navegação que causaram forte impacto na sociedade brasileira, como o caso Bateau Mouche IV, em 31 de dezembro de 1988, no qual morreram 55 pessoas, operado por empresa brasileira de navegação, decorridos mais de 25 anos, ainda está impune, imaginem com armadores estrangeiros que operam transporte de passageiros, em navios com mais de 2.000 passageiros, a maioria brasileiros. Como visto, a omissão da Antaq na regulação dos armadores estrangeiros no Brasil é muito grave, na medida em que transfere integralmente o risco da operação dos seus navios para toda a sociedade brasileira, por meio da União Federal, com forte impacto nas contas da União”, opina Agripino.


Cita Osvaldo Agripino que, nos Estados Unidos, para operar, é exigida prova da responsabilidade financeira dos armadores. Mas aqui, não. Em resumo, os armadores estrangeiros, que levam 100% da exportação e importação do país, são muito bem-vindos. Mas precisam ser inscritos junto ao Estado brasileiro, como ocorre nos Estados Unidos. Em resposta a uma consulta, o superintendente de Navegação Marítima e de Apoio da Antaq, André Luis Souto de Arruda Coelho, acaba de responder que, pelo artigo 5º da lei 9432/97, a inscrição de armadores estrangeiros é desnecessária, mas isso, certamente, poderá ser mudado diante de uma justa pressão de usuários e exame mais amplo das leis e da Constituição.


SEM TÉCNICOS
Em recente seminário rural, produtores reclamaram da falta de técnicos federais para certificar produtos agrícolas de exportação. Isso significa que, além de faltar acesso ferroviário, de os portos não suportarem o excesso de caminhões, da falta de armazenagem e tudo mais, agora há escassez também de pessoal do Ministério da Agricultura e da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

SKORPIOS
A geografia do Chile é única.  O pequeno país tem a forma de uma cobra, quase toda voltada para o mar – mesmo tendo perdido parte para o Peru, recentemente. A nação tem 5 mil km de costa, com baixa exploração do turismo marítimo. No entanto, ao contrário do Brasil, onde o setor só é explorado por unidades estrangeiras, o Chile tem uma empresa nacional. É a Skorpios, que há 40 anos, por iniciativa do grego Constantino Cárcamo, cuja família se radicou no Chile, atua na região gelada da Patagônia. Hoje, a empresa é chilena, e o grupo conta com três navios de turismo, todos de porte médio, para mais de 200 passageiros.

O Skorpios II, sob a batuta do comandante Belisario Martinez, que está há 57 anos , no mar, cumpre excursões de cinco dias. De Puerto Montt, a mil km de Santiago, toma-se a embarcação, rumo à bela Patagônia, patrimônio da humanidade. O ponto alto é a visita ao Glacial San Rafael, onde se pode extrair pedaços de gelo com 30 mil anos. É lá que ocorre a operação 30 x 12, quando se toma uísque envelhecido 12 anos com gelo de 30 mil. Apesar das notícias sobre aquecimento do planeta, a tripulação informa que um fotógrafo, em 2009, tirou duas fotos diárias, durante seis meses e constatou que o glacial Pio XI aumentou de tamanho, de forma comprovada cientificamente, pelas fotos.Isso é uma revelação impressionante, que em parte nega o degelo do planeta. Além disso, a Patagônia é um enorme acervo intocado de florestas, que ficam verdes no verão e brancas no inverno. Já os cumes dos Andes estão sempre brancos, mesmo no verão. O grupo Skorpios só faz cruzeiros no verão, pois, no inverno, seria necessário um quebra-gelo.

Durante o passeio, se pode ver uma criação de salmões com quase um milhão de unidades, criadas em cativeiro – em fazendas no mar. O ponto negativo é que não são vistos pingüins nessa rota; quanto a baleias e focos, pode-se vislumbrar apenas algumas espécies, vistas de longe.


PERNAMBUCO E CEARÁ


Pernambuco vai ganhar um estaleiro de US$ 20 milhões. O projeto é o Cambel BR, uma subsidiária do grupo espanhol Cambel Europa, que vai produzir blocos e embarcações de apoio às megaempresas do próprio setor naval, como o Estaleiro Atlântico Sul (EAS) e o Vard Promar, ambos em Suape. O Cambel está em fase inicial de implantação, no município de Itapissuma, nas mesmas instalações que há décadas pertenceram ao antigo estaleiro Navesul – que estava desativado há anos.

Assim, Pernambuco dá exemplo ao Ceará. O Promar iria ser feito no Ceará, mas a então prefeita, Luizianne Lins, do PT – hoje membro do conselho do BNDES – negou a instalação, afirmando que haveria poluição – sem atentar para o fato de que a região é uma das líderes nacionais em prostituição infantil. Um estaleiro efetivamente afeta o ambiente, mas também traz dignidade para milhares de chefes de família. A previsão é de geração de 500 empregos até o fim deste ano.“Vai ser uma grande oportunidade de o município se incluir nessa grande cadeia de desenvolvimento que é a cadeia naval”, comenta o prefeito de Itapissuma, Cláudio Xavier, o Cal Volia. “Já estamos buscando essa articulação com o Senai”, diz o prefeito. Como disse Indira Ghandi, o que polui o ambiente é o subdesenvolvimento.

AÇÃO DO CAP
Veio a público a informação de que a Associação Brasileira dos Terminais Portuários (Abtp), em nova fase, após mudanças em seu estatuto, quer trabalhar para realizar “ocupação eficiente” do Conselho de Autoridade Portuária (CAP). A notícia é polêmica, em primeiro lugar, porque, com a MP dos Portos, os CAPs ficaram esvaziados e passaram de deliberativos e consultivos. Portanto, pouco vão representar no cenário portuário. Em segundo lugar, o presidente da Abtp, Wilen Manteli, tem plena consciência disso, pois foi uma das mais importantes vozes contra a tentativa – bem sucedida – de se tirar poder dos privados, através do esvaziamento dos CAPs e de ampliação do poder dos burocratas federais, localizados em Brasília. Os órgãos federais regionais, como CDRJ, no Rio e Codesp, em São Paulo, também perderam poderes para Secretaria Especial de Portos (SEP) e Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq).

ENGARRAFAMENTO PORTUÁRIO
O engenheiro Marcos Poggi tem longa experiência em transportes. Foi diretor da Companhia Docas do Rio de Janeiro e subsecretário de Transportes do Governo fluminense. Adversário da destruição da Perimetral, Poggi não concorda com folheto distribuído pelas empreiteiras do projeto Porto Maravilha, que garantem aumento de 27% na capacidade de transporte nas proximidades do Porto do Rio, a partir de 2016. Segundo Poggi, a nova configuração, ao contrário, irá representar redução de 18% a 29% na capacidade para atendimento ao tráfego de passagem, mesmo com dos novos meios de transporte na região, o ônibus expresso BRT e o Veículo Leve sobre Trilhos (VLT).
Poggi esclarece que não tem objetivo precípuo de criticar as autoridades, mas, ao contrário, trabalhar de forma positiva, para evitar um gargalo na região da Avenida Rodrigues Alves. Lembra que o porto está aumentando o volume de suas operações, pois os dois terminais de containeres – Libra e Multiterminais – estão sendo duplicados e a cada dia há mais movimento de aço e na área de suporte a plataformas da Petrobras.

TEMOR DE CORTES
A aliança entre os governos do Partido dos Trabalhadores (PT) com a construção naval é ampla. Lula injetou recursos no setor e tirou teias de aranha de praticamente todos os estaleiros do país. Além disso, ensejou a reabertura de inúmeros novos empreendimentos. Dilma Rousseff manteve o compromisso e, no fim do ano passado, reafirmou sua intenção de apoiar o conteúdo local e a realização de obras no Brasil.

No entanto, fontes de Brasília temem que o secretário do Tesouro, Arno Augustin, esteja imbuído de impor dois tipos de cortes aos gastos: tanto de forma clara como disfarçada. O corte claro é o que sai no Diário Oficial: o Governo anuncia que a verba para tal atividade será diminuída. O segundo corte é mais sentido: o Governo não se pronuncia, mas a verba é sempre adiada, a qualquer pretexto.


Algumas fontes já detectaram intenção de Augustin de passar um pente fino nos gastos. E o setor marítimo depende de repasses para o Fundo de Marinha Mercante (FMM). O fundo tem sua própria verba e, na era tucana, quase todo o saldo era transferido para pagar juros da dívida pública. Desde Lula, além de se respeitar a verba específica do FMM, novos créditos têm sido concedidos. No entanto, já se nota algum atraso nos repasses. Não se trata de preocupação de curto, mas de médio prazo. Nos planos de expansão da Transpetro, por exemplo, faltam três navios para se chegar a 49, que é o número exato. Antes desses três navios, é prematuro se falar em Promef III. Os planos oficiais incluem financiamento não só a plataformas como a navios-sonda. E, para isso, é necessário contar com boa vontade da Secretaria do Tesouro Nacional, para liberar verbas adicionais ao orçamento básico do FMM.

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