Luiz Valle - Administrador de empresas e presidente da Cavalo Marinho
Depende. Se for considerada política de governo, naturalmente, sim. As ruas lotadas de automóveis e entupidas com engarrafamentos mostram com clareza que não há mais como estimular a economia diminuindo impostos sobre a compra de veículos.
Tampouco promovendo a venda da chamada linha branca: raros são os brasileiros que não possuem geladeira, fogão e máquinas de lavar em casa.
Os esforços feitos pelo governo, no sentido de dar impulso à economia, têm de mudar o foco e passar a fomentar setores produtivos ainda não explorados e que tenham elevado potencial de produção.
É o caso da aquicultura. Importamos muito peixe, produzimos pouco, exportamos quase nada embora disponhamos de todas as condições naturais, além de vocação, para transformar esse setor em uma das principais locomotivas do agronegócio.
Um exemplo de como se faz isso vem do vizinho Chile. Preocupado com a concentração da aquicultura em uma só região de seu território (o extremo Sul) e em apenas duas espécies (salmão e mexilhão), o governo chileno se empenhou no desenvolvimento do pacote tecnológico de espécies nativas abundantes na região norte do país.
Pesquisadores foram enviados ao Brasil para colher informações sobre a aceitação desses novos pescados por nossos consumidores.
Nessa fase, todos os investimentos foram feitos pelo governo. A iniciativa privada só tomará parte no processo depois que o ciclo produtivo das novas espécies pesquisadas for dominado e os mercados consumidores, assim como o potencial de retorno do investimento, forem analisados. O que impede o governo brasileiro de pôr em prática ações congêneres?
Outro exemplo vindo do mesmo vizinho: nesta semana concedi entrevista a uma empresa contratada pelo Escritório Comercial e Econômico do Chile, o ProChile.
O intuito do trabalho, segundo a pesquisadora, é conhecer um pouco mais o mercado de alimentação em São Paulo e no Rio de Janeiro. Estavam entrevistando formadores de opinião que tivessem ligação com o mercado: importadores e distribuidores, supermercadistas, chefs de restaurantes, jornalistas especializados, entre outros.
Durante a entrevista, pareceu-me evidente que o país pretende aumentar a exportação de mexilhão para o Brasil. (Para registro: os fatos não os favorecerão. Em três anos o Brasil não mais importará mariscos.
Em cinco, passará a exportador. Nossa produção estará mecanizada e será suficiente para atender à demanda interna com mexilhão mais barato que o importado.)
Voltando ao PIB: precisamos de mais carros nas ruas? Não. Mas necessitamos de mais peixes nos pratos. Inclusive no prato da balança comercial, no qual pesamos as exportações.
Que tal investirmos recursos governamentais em desenvolvimento de pacotes tecnológicos que façam com os bagres do Amazonas o que os vietnamitas fizeram com o pangassius, hoje cultivado em larga escala e exportado para o mundo inteiro?
Esse, sim, é o tipo de aplicação de recursos que produz resultados sustentáveis, capaz de gerar empregos por anos a fio, além de riquezas e divisas.
Somos um país plural em recursos, mas muitas vezes cruelmente singular em criatividade e inovação. A aquicultura é o mapa do tesouro escondido sob as águas dos nossos rios e mares.
Não podemos permanecer a vida toda como piratas de contos infantis, com um dos olhos tapado...
Luiz Valle é administrador de empresas e presidente da Cavalo Marinho - criação e beneficiamento de frutos do mar
Fonte: Brasil Econômico / 23/4/2013