Regiane de Oliveira e Priscilla Arroyo (redacao@brasileconomico.com.br)
Levantamento mostra que, pelo menos, 26 artigos da Constituição não foram regulamentados por falta de ação legislativa.
O artigo 6º da Constituição de 1988 é claro em determinar quais direitos devem ser garantidos pelo estado à população: "educação, saúde, alimentação, trabalho, moradia, lazer, segurança, previdência social, proteção à maternidade e à infância, assistência aos desamparados."
E o caminho para a garantia desses direitos passa por uma trama de dispositivos constitucionais, que deveriam dar suporte para a sua concretização. O problema é que, 23 anos depois, boa parte desses dispositivos não foi regulamentada. E os reflexos pesam em áreas essenciais para o país.
Segundo levantamento preliminar feito pela assessoria jurídica do senador Pedro Taques (PDT -MT), pelo menos 26 dispositivos constitucionais ainda precisam de regulamentação. O senador está montando uma comissão extrapartidária, para discutir o tema. Marco Aurélio Marrafom, jurista que integra a comissão, diz que o processo legislativo brasileiro é lento.
"Somente hoje estamos confeccionando o estatuto jurídico da Petrobras, por exemplo." Ele destaca que muitos projetos ficam parados em comissões para atender interesses políticos. "Também temos que considerar a falta de capacidade de alguns deputados e senadores. Muitos nem sabem o que é a Constituição", lamenta Marrafom.
O judiciário vem suprindo essa ausência, mas seria desejável que a regulamentação viesse do Congresso, afirma o advogado Pedro Serrano, especialista em direito constitucional. Segundo ele, mesmo os mandados de injunção - que permitem pedir a regulamentação de uma norma da Constituição, quando os poderes competentes não o fizerem -, não foram regulamentados.
"Eles são muito utilizados em analogia com o mandado de segurança", explica Serrano, que não é a favor de uma nova constituinte, proposta que vem sendo defendida pelo PSD de Gilberto Kassab. "Antes de mudar uma lei, precisamos aprender a obedecê-la. Aplicar e universalizar os direitos fundamentais é um desafio no país."
Marrafom diz que a função da regulamentação seria dupla: evitar a judicialização da política e reduzir o peso legislativo, que hoje recai sobre o Supremo Tribunal Federal (STF).
"Hoje é necessária essa interferência do STF por causa da falência política. A política presta contas pelo bem ou pelo mau, o Supremo não, o que pode causar um déficit democrático em sua ação."
Nem todos concordam com a iniciativa de Pedro Taques. "Ao invés de direcionar o foco para a regulamentação, o Congresso deveria dar prioridade à discussão das reformas política, tributária e trabalhista. Não se trata de fazer uma nova Constituição, mas de atualizar partes importantes do texto, que está defasado", diz Luiz Tarcísio Teixeira Ferreira, da PUC de São Paulo
Educação
A educação não está entre as prioridades da comissão do deputado Pedro Taques. Porém é uma das áreas que acumulam problemas com a falta de regulamentação.
Se dependesse apenas da Constituição de 1988, por exemplo, já deveria estar em discussão a terceira versão do Plano Nacional de Educação (PNE). A lei do PNE saiu em 2001, mas ele nunca conseguiu avançar porque falta regulamentar o regime de cooperação entre União, estados, Distrito Federal e municípios.
"Este é um dos principais gargalos da educação e um dos principais entraves para se estabelecer o Sistema Nacional de Educação, previsto na Constituição", explica Daniel Cara, coordenador da Campanha Nacional pelo Direito à Educação.
E um dos resultados dessa falta de regulamentação é que "a União participa financeiramente com valor menor do que manda a Constituição", explica Cara.
Fonte: Brasil Econômico - 7/10/2011