Rogério Mori - Professor da Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (FGV)
Um ponto de interesse no ambiente financeiro internacional diz respeito à relativa calmaria dos mercados nos últimos meses. Essa tranqüilidade tem se refletido nas altas das bolsas e na recuperação dos preços das commodities internacionais.
Ao mesmo tempo, os sinais positivos do lado financeiro também têm se transmitido para o lado real da economia e a atividade econômica global tem dado mostras de retomada nos últimos trimestres.
Em princípio, poderia se imaginar que os fantasmas de uma nova crise estariam bem distantes.
A própria economia americana tem se recuperado de forma quase sistemática ante os impulsos fiscais proporcionados a partir de fins de 2008.
Nesse sentido, a liquidez abundante injetada pelos bancos centrais dos países desenvolvidos evitou o colapso do sistema bancário e as instituições financeiras americanas e europeias, embora não tenham voltado a operar da mesma forma que anteriormente no mercado de crédito, sobreviveram ao pior e procuram melhorar seus retornos em operações financeiras em outros mercados.
Embora o cenário róseo de curto prazo se mostre favorável, nuvens começam a se formar no horizonte do sistema financeiro global. Um dos principais pontos de preocupação é a questão europeia.
Reconhecidamente, vários países que ingressaram na comunidade e adotaram a moeda única não realizaram o ajuste fiscal devido e passaram a acumular uma dívida pública crescente de forma sistemática.
Esse processo tem se dado ao longo dos últimos anos e vários países da Europa começam a enfrentar problemas em função dessa dinâmica: Portugal, Espanha, Itália, Irlanda e Grécia.
Sob essa perspectiva, dado o tamanho da dívida desses países e das dificuldades de um ajuste fiscal mais pronunciado, os mercados têm se mostrado cada vez menos dispostos a rolar e financiar a dívida desses países.
A adoção da moeda única inviabiliza a possibilidade de uma eventual monetização dessa dívida por esses países ante sua relativa perda de autonomia monetária.
Em face disso, os riscos de calote desses países são crescentes e os mercados começam a demonstrar preocupações em torno dessa questão. Caso a moratória se torne uma realidade, novas turbulências deverão ser verificadas.
Outro ponto de dúvida remete à discussão em torno da economia americana. Sob essa ótica, a maciça liquidez injetada pelo Fed, o banco central dos EUA, no sistema financeiro americano começa a trazer algumas preocupações e os debates começam a se centrar em torno de como retirar esse excedente de liquidez.
Algumas propostas giram em torno de uma diminuição gradativa do balanço do Fed de forma relativamente simultânea à elevação gradual das taxas de juros de curto prazo na economia americana.
Sob essa perspectiva, as dúvidas nesse processo remontam à relativa fragilidade dominante ainda em boa parte do sistema financeiro americano e os riscos de uma nova crise detonada por problemas em um ou mais bancos.
De qualquer forma, o cenário financeiro global não é tão desprovido de riscos como se poderia supor inicialmente e o surgimento de um novo foco de crise, sem dúvida, atingiria o ambiente de recuperação global e a economia brasileira.
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Rogério Mori é professor da Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (FGV)
Fonte: Brasil Econômico - 25/5/2011
25/05/2011