Editorial
O que é bom para os Estados Unidos é bom para o Brasil sentenciou, há mais de quatro décadas, o baiano Juraci Magalhães, um dos líderes políticos do golpe militar de 31 de março de 1964. A afirmação, feita quando ele foi nomeado embaixador em Washington, causou desconforto até mesmo entre militares que acabavam de assumir o poder, mas sua repercussão se restringiu às seções de humor dos jornais, ainda no período pré-censura.
Com o tempo, foi relegada ao folclore político nacional. Vivesse hoje, o dirigente da conservadora União Democrática Nacional (UDN) poderia compensar a frustração de ver na presidência da República uma ex-militante dos movimentos de oposição aos militares com os novos hábitos de consumo dos brasileiros.
Beneficiada pelo aumento da renda - ocorrido numa época de plenas liberdades democráticas - a população começa a adotar posturas que lembram muito o estilo de consumo dos americanos, criticado, mas também admirado e imitado durante décadas.
Introduzida no país há 70 anos pela Avon, as chamadas vendas "porta a porta", hábito tradicional nos EUA, embora ainda concentradas em produtos de higiene e beleza, batem recordes e atraem novos grupos, como o Boticário.
O que acontece nesta faixa popular de consumo também se repete em itens mais sofisticados. É o caso das picapes e utilitários, forte símbolo de status do americano médio até a crise do subprime de 2008, e agora conquistam cada vez maior número de brasileiros.
A exacerbação do consumo, contudo, leva as pessoas a um limite perigoso de endividamento, justamente o grande drama enfrentado pelos americanos nos últimos dois anos.
Hoje, 22% da renda familiar brasileira está comprometida com dívidas, percentual superior aos 15% da família americana. Com uma alimentação rica em calorias, em parte pela melhoria da renda, aumentam os casos de doenças como hipertensão e diabetes.
Excesso de peso e obesidade afligem 60% da população brasileira adulta. Não foi bom para os Estados Unidos e também não é para o Brasil.
Fonte: Brasil Econômico - 14/2/2011
14/02/2011